Por vezes as palavras confundem-se quando tento transmitir o que sinto.
Por isso o meu silêncio vai permanecer no amor e no conforto em saber que o meu pai descansa em paz, ainda que isso me custem as lágrimas e a revolta por já não poder partilhar tantas coisas com ele...
Como o neto/a que vai nascer no mês do aniversário dele, ou mesmo para lhe dizer que no dia do funeral a Dona Clarice (a vizinha) levantou-se e proclamou um discurso de me levar às lágrimas misturadas com riso ("mê vizinho querido.. obrigada por todas as vezes que me abristes a porta.. eras o mê vizinho do coração...") - sabendo que isso o iria fazer rir também.
Não desejo escrever palavras de despedida nem expressar o que sinto por ele, porque felizmente tive oportunidade de as dizer a ele. Mas nós, seres humanos somos assim... Gostaríamos de ter só mais um dia, só mais uma hora, só mais um minuto para estarmos com aqueles que amamos e que partiram.
Não me quero recordar do Mário fraco, com falta de oxigénio, com menos peso do que eu (dizia ele que isso era uma proeza) e vulnerável a tudo. Até porque para mim esse Mário nunca existiu. Para mim será sempre o barbudo de olhar meigo que balançava o pé sempre que ouvia boa música, que inventava alcunhas para os filhos (e agora para as netas), que gostava de boas conversas, boas risadas, boa comida e de estar rodeado de família e amigos. O Mário inteligente e doutorado que queria fazer um piercing na orelha e que depois de reformado gostaria de ter uma casa na praia em Moçambique.
O Mário que até ao final manteve a pose e que mesmo no último momento conseguiu partir com classe.
Esse é o Mário Alberto que faço questão de que os meus filhos tenham conhecimento e de que os amigos se lembrem.
É o meu pai.